Um rio - o caminho do sêr... Ana Fonseca



Um rio no seu percurso ora acidentado, atribulado ora doce, cativante e refrescante permite-se correr livre por muitos que sejam os obstáculos. Não adianta querer alterar-lhe o curso, desviá-lo das suas margens, secá-lo. Ele até pode aceitar as alterações por instantes – o que na vida de um rio pode significar anos – mas há sempre o momento do retorno, do grito que lhe irrompe do caudal e o faz desbravar caminhos ao encontro do leito original… e quando tal acontece é vê-lo em perfeita glória, exultante, vibrante…
Com um ser humano que se guie pelos sentimentos, que ouça a voz do coração, que aceite fragilizar, sentir, sofrer para depois de tudo chorar, permitir-se rir, amar e ser amado, assim também é.
Ser humano e rio têm um mesmo caudal, o de serem livres para se exercerem sem igual.
Um ser humano assim tem os seus momentos… momentos em que exerce o seu direito à reflexão, ao mergulho de alma, em que se contempla no calor de uma lágrima que lhe irrompe livre pelo rosto. Também ele rio, também ele água…
Sabe-se muito mais que um elemento como também se sabe mais que um simples humano que se exerça como mero transeunte no caminho da vida. Sem vã glória, aceita-se anjo que decidiu ser humano e experienciar-se na Terra.
É assim que se aceita, se contempla, se perscruta até ao âmago, se confronta, energiza e alimenta e não é fácil. É o primeiro a aceitar a sua fragilidade e a reconhecer o quão é difícil perseverar, ir ao encontro de si numa busca incessante de iluminação e discernimento.
Sabe que tem de se perdoar de tudo, mas de tudo mesmo e dar-se a esse direito é o passo mais difícil de dar. Pode ensaiá-lo mas dá-lo, essa é outra questão!
Sabe que o perdão é o primeiro passo para o verdadeiro amar, que só depois de o fazer outros céus se abrirão, outras pontes se estenderão a seus pés no trilho onde agora só vê abismos. Sabe que tem de acreditar, abrir as asas e voar como simples caudal que irrompe livre e cai em cascata na serenidade de um qualquer lago…
Sabe e serena-se pois só na solidão acompanhado de si mesmo poderá agir em conformidade com o seu sentir, em respeito pelo seu ser e aí finalmente exercer-se vibrante.



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