OXALÁ.. Ana Fonseca da Luz










Oxalá não te oiça chegar. Oxalá não te veja.
Hoje, não ia suportar encarar-te.
Sufoco em palavras que nunca te direi e em lágrimas que, de tão salgadas, secam, mal me caem dos olhos.
Olho e não vejo. Carrego comigo estas dores que me deixam sem forças e nascem todos os dias mal acordo.
Oxalá entres de mansinho. Oxalá eu esteja de costas, quando me roçares com o queixo na nuca.
Hoje, não ia suportar encarar-te.
A solidão tortura-me e dá-me alento. É como se fosse minha aliada, nesta cruzada contra mim e contra ti.
Hoje, até os teus olhos me incomodam.
Carrego-te, porque não te consigo fechar a porta, porque tu me estás entranhado. Lavo as mãos, o rosto, todo o meu ser, como se, com isso, tu desaparecesses. Mas não, continuas aí e eu de costas, porque não consigo nem olhar para ti.
Fecho-me no meu mundo de lamentos que só eu oiço e grito tão alto que ninguém me ouve.
Oxalá amanheça só de noite, para que possa acordar para dormir, logo de seguida.
Oxalá os teus lábios se colem e se calem pelo menos hoje. Pelo menos hoje, não vou suportar encarar-te.
Hoje, até a tua voz, sempre doce, me incomoda.
Batem à porta. Abro e ninguém entra.
Fecho a porta e instala-se no meu peito a alegria de estar só, perdidamente só, gloriosamente só!
Oxalá o tempo me traga o que a vida me roubou.

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