ESTRELAS NA NOITE... Célia Champlon










Entrou, como de costume, no café da malta. Começou nos cumprimentos habituais. E uma vez mais ele largou tudo e todos quando a viu. Ficaram só os dois à conversa. Ela precisava da ajuda dele para o seu trabalho e ele sabia isso. Combinaram encontrar-se.


Continuaram à conversa até que ele lhe confessou que queria já lhe ter telefonado. Ela corou. Até porque com ele sentia dificuldade em o olhar directamente. Era como se ele ultrapassasse a barreira dos olhos. Ele sorriu. Até parecia que ele lhe lia os pensamentos. Deram mais dois dedos de conversa e despediram-se como de costume.

Sentada à secretaria, absorvida pelo trabalho, atende instintivamente o telefone que toca. Não sabe como identificou de imediato a sua voz. Era a primeira vez que se falavam ao telefone. Sentiu o bater acelerado do coração e gaguejou. Ele riu divertido pela surpresa provocada. E ela corou. Tinham que alterar o combinado por razões do trabalho dele.

Entrou, como de costume, no café da malta. Ele já estava à sua espera, rodeado de montes de papeis. Cumprimentaram-se. Mas, como se se escondessem atrás dos papeis, trabalharam. Nos intervalos do silêncio falaram exclusivamente do trabalho.

Ela evitava olhá-lo e estranhamente ele fazia o mesmo. Pairava no ar um ambiente diferente do normal entre eles. Foram-se juntando a eles amigos que desanuviaram o clima. De conversa em conversa o grupo decidiu ir conhecer o novo bar.

Encostada ao balcão à espera da sua bebida ele apareceu a seu lado. Tinham-se evitado até então. Lado a lado ele segreda-lhe ao ouvido “quero falar contigo”. E ela sentiu como se o chão lhe faltasse debaixo dos pés. “Espera, vamos lá fora que aqui não se consegue falar”, disse-lhe.

Ela não conseguiu articular palavra. Acenou com a cabeça e esperou. Seguiu-o sentindo todo o seu corpo a tremer. Tinha medo do que ele lhe quereria dizer mas ao mesmo tempo sentia a excitação por ele lhe querer falar.

Ele saiu e parou e ela ficou parada no degrau da saida do bar. Atrás dele. Ele virou-se e os seus olhos encontraram-se ao mesmo nivel. Ela baixou o olhar porque se sentia a corar de novo. Mas o escuro encobria-a. E o silêncio da noite ouvia-se.

E então baixinho ouviu-o a dizer-lhe “não sei o que se passa entre nós mas já não é a mesma coisa”. Ela olha-o nos olhos pela primeira vez e sente o desejo de lhe tocar para substituir as palavras. Mas não o faz. Continua sem conseguir dizer nada presa no seu olhar. Ele aproxima-se mais e continua “não achas que temos de falar nisto?”.

E ela, sempre faladora, está bloqueada nas emoções e sentimentos daquele momento. Sabe que tem de dizer alguma coisa, mas o quê?. Ela também sente o mesmo. Finalmente ouve-se a dizer-lhe “tens razão, sinto o mesmo, mas não sei o que te dizer”.

E o rosto dele ilumina-se como quem acaba de receber a melhor das prendas. A pequena distância entre eles desaparece e ela só o vê a abraça-la e ela só o sente a beijá-la. Uma eternidade depois ficam olhos nos olhos sem dizer palavra. Mas os olhos deles brilham como as estrelas naquela noite clara.

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