A ÚLTIMA VIAGEM


Hoje, sinto-me plena de mim, como se eu me bastasse.
Apesar da inquietação da minha alma, que me remete para um silêncio quase doentio, apesar desta loucura de cores, aromas e sentimentos difusos e paralelamente complexos, hoje sou mais eu, do que era ontem.
Talvez porque amanheci com a ternura a escorrer-me dos olhos e uma saudade imensa que me espreme o coração ou então, apenas porque eu e a minha solidão somos imensamente felizes!
Recuso-me a viver na mentira.
A partir de hoje, declaro guerra à incompetência, à mediocridade e essa tua falta de jeito para me dizeres o que eu quero ouvir.
Amanhã, traz-me flores, traz-me borboletas coloridas em permanente metamorfose, não de formas, mas de cores.
Não quero o cinzento, nem o castanho e muito menos o preto.
Traz tintas, azuis, verdes, amarelas e pinta-me cenários onde eu possa pôr a minha cama e ficar lá, deitada, de olhos perdidos em todas as cores que me trazes, para que eu consiga matizar os sentimentos que me povoam, de novas cores e partir de alma aberta.
Não quero o branco!
O branco faz-me dormir!
Recuso-me o dormir…
O meu corpo vai ter tanto tempo para dormir! Já a minha alma…
A minha alta está proibida de adormecer. A minha alma tem deveres a cumprir.
Há quem espere por ela, lá do outro lado do muro.
Por isso, como posso eu embalá-la em tons de branco e pastel, deixando-a adormecer dentro de mim?
Como posso eu recusar-me a cumprir o propósito que me trouxe até aqui?
Olhas-me espantado!
Achas-me insana por te dizer todas estas coisas.
Não vês que o relógio não para, e que é chegado o tempo de todas as confissões?
Talvez seja por isso que hoje me sinto assim, poderosa, capaz de enfrentar tudo e todos.
Ou então, talvez seja só impressão minha e eu já não esteja aqui…
Talvez eu já tenha transposto o muro e a força que hoje carrego em mim, não seja apenas a força deste vida, mas a força de todas as vidas que já vivi.
Já agora, deita-te aqui, ao pé de mim, nesta cama que pintaste de azuis, verdes e amarelos, apaga a tua dor e faz-me companhia, até que eu parta, para esta última viagem.

Deixo-te a minha solidão e um pouco da minha luz.
Vais ver que nunca vais estar sozinho…

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