As cinco estações... Ana Fonseca da Luz


Há em mim uma mágoa distante que me soa a tempo perdido. Não sei realmente descrever esta sensação de perda que carrego sempre comigo. É como se todos os dias acordasse de um sonho que não é o meu. Ou talvez este sonho seja o meu, esta vida é que parece não me pertencer. Hoje, acordei com uma mágoa imensa no peito. Uma mágoa que não se consegue descrever mas, que com certeza, outros já sentiram com a mesma intensidade com que eu a sinto agora. Esta mágoa, esta sensação de vazio, é só minha. Foi feita à minha medida, propositadamente para mim… Olho o chão onde me apetece deitar e chorar para expurgar este desalento que hoje amanheceu comigo, que hoje floriu na minha alma e me deixou assim, cheia de pena de mim. Traço em linhas largas um itinerário, para tentar não sair deste meu caminho que se desenha à minha frente, desordenado. Com princípio mas sem fim… Sento-me na pedra que já amoleceu há muito e espero por ti. Ou será que é por mim que espero? O chão continua à minha frente, recto, ordeiro, ladeado de rosas rubras pinceladas de um amor inconstante, porém eterno. Não. Hoje não renasci para esta vida açucarada. Tenho na minha boca o amargo da desgraça e da fatalidade. Tenho nos olhos uma sombra intermitente que ora me mostra um caminho ora me mostra a imperfeição das coisas, que hoje estão entranhadas em mim. Apetece-me ficar por aqui. Recusar a caminhada que escreveram para mim porque me sinto infinitamente sozinha… Não. Não vou rezar, nem praguejar, nem sequer parar para cheirar as flores que enfeitam os canteiros da minha existência, nos dias em que a minha vida é um dia solarengo de Verão ou uma noite amena de Primavera. Hoje, no meu peito é Outono No coração, Inverno. E na minha alma uma estação que desconheço… Retomo pesarosamente o caminho, porque me pareceu avistar-te ao longe. Aceno-te com as minhas mãos perfumadas de jasmim Retribuis o aceno e, nas tuas mãos, há rosas, espinhos e uma réstia de um amor sublime. Ergo-me finalmente deste chão empedrado de lembranças e retomo o caminho para o sonho que me trouxe até ti. De mãos dadas, num aconchego imortal, choramos ambos por não conseguirmos voltar atrás no tempo. Volto a repousar a cabeça numa nuvem que passa, na ânsia de adormecer ou de pelo menos de serenar esta angustia que me consome e que a ti, quase te mata. Finalmente, lado a lado, derrubamos a tempestade dos sentidos e envoltos na intemporalidade do instante, que é mágico, debruçamo-nos no vazio e retomamos a estrada infinita que nos leva para lá de todas as coisas e de todos os afectos. Exaustos, exangues, voltamos a adormecer na estação do ano que acabámos de inventar e que se chama eternidade…

Nenhum comentário:

Postar um comentário