Deixa-te ficar... Ana Fonseca da Luz


- Não vás ainda… deixa-te ficar até que eu tenha sono.

Dizes-me tu com os olhos carregadinhos de mágoas e de lágrimas, enquanto ajeitas a forma do teu corpo, à cama desfeita pelos pesadelos de outros tempos, que a partir desta noite, te vão começar a visitar. É como se te deitasses do outro lado do tempo e esse tempo não te pertencesse. Mesmo assim, enquanto já partes para esse mundo de repouso inquietante e os olhos se fecham contra a tua vontade, dizes mais uma vez com uma voz magoada, de cetim:

- Deixa-te ficar…

Já não terminas a frase que te morre na boca e enroscas-te numa posição de defesa, de cria assustada, sem mãe. Passo-te a mão pelos cabelos e invejo-te essa serenidade que aparentas, mas que eu sei que é passageira. Depois também eu caio num passado distante enquanto te olho e sinto-me mais só do que nunca. Pudesse eu voltar atrás e tudo seria diferente. Poderia ser diferente mas, será que seria melhor?

E eu deixo-me estar, como sempre, velando por ti e pelo teu sono, enquanto a insónia me faz companhia. Sossega. Eu estou aqui...

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