"Inter"dimensões... Ana Fonseca


Um apelo irresistível guia meus passos à orla do mar. Apesar de estar frio, de o Outono já ter cedido lugar ao Inverno na dança inexorável dos estações, de Perséfone estar com o seu Amor, cedo ao impulso, descalço-me, retiro os collants que me protegem do frio e mergulho os pés na areia…

Ansiava tanto por este momento, o sentir-me pequenina face à imensidão que contemplo e assim me fundir neste universo de pequenos grãos imbuídos de vida a contento.

Sinto-me a transmutar, serena, neste areal onde como qualquer grão aguardo o doce beijo da vaga que se espraia em terno e doce caudal.

Aqui vou eu, revolvida entre tantos outros, submersa na rebentação que me eleva e transporta. Deixo-me levar, já estou longe da orla do mar, sou grão de areia a navegar…

… vou dar à costa noutro lugar. Por certo, bem familiar…

Ergo-me e pouco a pouco, refaço-me como me conheço, cada poro um grão de areia a brilhar, constelação de pequenas estrelas que me irrompem e fazem sol mesmo quando no firmamento brilha o luar.

À medida que me afasto da margem, dissipa-se a bruma que me envolve, cai o véu que me tolda os sentidos. Sinto-me a abandonar uma gruta e a ser capaz de encarar a luz sem qualquer disfarce, sem entrave…

Uma civilização irrompe iridescente em meu olhar… deixei-me conduzir a outra dimensão, universo paralelo que ainda alberga a perdida e renascida Lemúria, civilização de Amor, de conhecimento, de dourado calor na alma e no olhar dos seres, no temperado dos gestos, no cristalino dos tectos que lhes resguardam as vidas, na translucidez das fontes que lhes alimentam as veias, na cura sempre presente nos cristais que lhes ornam os estares, prontos a ser alquimia de ser em todos os lugares e na profusão de se conhecer, divide-se, por fim, o ser em masculino e feminino, para que assim se possam intensificar as experiências do viver, para que se percorram os séculos na procura do equilíbrio perdido, fusão de yin e yang, um novo Ser…

Imersa nesta viagem, neste estar, na avalanche de recordações, de imagens que me pululam do olhar, decido abrir os olhos.

Afinal não estou na praia. Estou submersa no meu quente banho mas, surpresa das surpresas, a água é esmeralda e aqui e ali bailam fragmentos de algas. Afinal sempre andei a viajar por aí… e agora, consciente do percurso, de onde venho, do que me sou, abandono-me e fluo no vapor que exala do quente que me envolve e serena… flutuo…

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