O alaranjado da lua... Ana Fonseca


Num momento de acutilante e ferida lucidez, procuro o meu caderno. Encontro-o molhado, frio, prenhe das lágrimas que me irrompem dos olhos e o correr do aparo da caneta é um imenso caudal azul…

Já sei porque não chove há tantos sóis. As nuvens emprestaram-me todas as gotas para serem o orvalho de meus olhos e despontarem em rios de libertação rumo a um vazio e desamparado colo.

Sinto o abandono e grito.

Gritam-me as entranhas de dor, gritam-me os sentidos submersos na ausência do meu Amor, gritam-me as escolhas que faço no caminho e gritam as angústias que dissonantes me abrasam os sentires.

Grito e desespero-me só, no meu canto.

Deixei a dor entrar. Fiz dela companheira nos instantes que desfolho com a lança cravada no sereno do meu seio. Recolhi-a em mim e agora só me cabe chorá-la até ao fim.

De tanto a chorar, caderno e eu, revertemos a polaridade, desafiámos as leis da física e agora as lágrimas correm íngremes rumo à Lua onde lhe preenchem os vazios com oceanos vermelhos de uma ausência sofrida em mim.

Por isso, se hoje olhares a Lua e a vires alaranjada saberás que fui eu que a toldei com o sangue do meu olhar e nem o azul do aparo conseguiu a dor contrabalançar, nem o desabafo foi capaz de me atenuar…

Peço-te, recolhe-me na Lua e tece-me um casulo em que crisálida ficarei até que a Primavera desponte no teu olhar. Peço-te, hiberna-me em ti e no despontar dos ventos de vida nas asas dos pássaros, lembra-te de mim, procura-me e acorda-me desta letargia … que agora, aqui me fico, perdida, entre as folhas desta tristeza sem fim…

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